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3 avril 2024No dia 3 de fevereiro, LITERANTO estava na biblioteca Gulbenkian da Casa de Portugal de Paris com o escritor Carlos Nuno Granja. Sara Novais Nogueira, criadora do projeto LITERANTO, também estava presente. O âmbito do projeto é promover e divulgar às crianças e aos jovens a língua portuguesa através das artes. Carlos e Sara ofereceram à Cap Magellan uma entrevista exclusiva, na qual explicam-nos tudo!
Cap Magellan: Olà Carlos e Sara! Espero que esteja tudo bem. Sara, como é que tiveste a ideia do projeto LITERANTO? Como é que começou?
Sara Novais Nogueira: Primeiro porque fiz o Mestrado de Línguas e Literaturas na Sorbonne ligado ao português e depois também com a minha tese de investigação. Comecei a pensar e a perceber a necessidade de haver esses tipos de eventos ligados sobretudo aos mais jovens para que mantenham a língua portuguesa como uma herança. Surgiu a ideia do projeto LITERANTO, que é virado sobretudo para os mais jovens, mas que vai dos 0 aos 100 anos. As famílias também se investem porque é principalmente nas famílias e na casa que começa a aprendizagem da língua portuguesa. Portanto, tive a ideia de trazer aqui em França alguns autores sempre que posso, para que possam divulgar as suas obras de arte. Na minha opinião, é através das artes que conseguimos chegar muito melhor à língua.
Cap Magellan: Como é que encontras os autores em geral? São sempre autores vindos de Portugal?
Sara Novais Nogueira: Nem sempre. Também já têm vindo autores do Brasil, por exemplo. Já tivemos aqui uma autora, a Cláudia Nina do Brasil, já tivemos a Marie Ange Bordas que não veio do Brasil de propósito mas é brasileira e vive aqui em Paris. Portanto, vai surgindo conforme haja verbas que até agora não tem havido. O que surge é que, ou os autores vêm por eles próprios, ou porque encontram-se aqui ou moram aqui, vêm fazer algum espetáculo e mostrar a sua arte através da língua portuguesa. Agora, procuramos sobretudo verbas para o projeto, para poder pagar esses autores porque é também importante que eles possam estar mais à vontade, porque é merecido e é muito importante. Procuramos verbas para quem se quiser candidatar, ajudar-nos neste projeto para que o projeto continue e para que possamos trazer cada vez mais autores cá, para envolver os jovens, sobretudo a vossa geração.
Cap Magellan: Carlos, para ti é uma honra estar em Paris e poder mostrar as tuas obras às crianças nomeadamente?
Carlos Nuno Granja: Claro que é uma honra e um grande privilégio estar aqui. Nos últimos 12 anos publiquei 36 livros e são 19 para os mais pequenos. E vou continuar a publicar! No entanto, o mais importante não é mostrar o meu trabalho: o mais importante é a promoção da leitura. É isso que me dá um grande gosto: saber que estou a contribuir de certa maneira. Não é para a salvação do mundo, não estou a dizer que a literatura salva o mundo, não é isso a ideia, mas é um pequeno contributo. Senti este contributo para promover a nossa língua quando fui para a Coordenação do Ensino português em Inglaterra, no Instituto Camões, e tenho sentido que ao longo das gerações, ela se tem vindo a perder, com esta vaga de fundo que ainda continua a ter emigração para França, para Inglaterra ou para outros países. O que eu noto é que, de facto, ela se tem vindo a perder. E perder-se em vários sentidos: na forma como nós vemos a imigração em Portugal e a forma como ela depois acontece nos países onde as pessoas se estabeleçam. Portanto, isto é um trabalho que é meritório, o trabalho de LITERANTO, o trabalho da Sara. É muito meritório e é importante que existam tantas pessoas que estão nos lugares, entre as comunidades e que promovem projetos desta natureza para que a língua portuguesa permaneça, prevaleça e que resista. Aparece igualmente como uma forma de envolver as comunidades e chamá-las para os livros e para a leitura. Nós estamos aqui a falar da importância da questão da língua falada mas há aqui um trabalho que é muito conjugado que é a existência do livro: a partir do livro vem a questão da oralidade. O livro é fundamental para depois estabelecer esta conexão entre o que é falado e o que é escrito. O livro é um modo e é a partir deste modo que depois podemos desenvolver a resistência da língua portuguesa como língua falada entre as diversas comunidades espalhadas pelo mundo. Para mim, estar em Londres, estar em Paris, estar nesta envolvência, neste ambiente é uma honra e um grande privilégio.
Cap Magellan: Sobretudo porque aqui há muitos emigrantes e lusodescendentes. Acho que a minha geração perde esse falar português, essa língua e acho que isso é uma pena.
Carlos Nuno Granja: Sim, sem dúvida. Em relação ao LITERANTO como outros projetos similares, é uma forma também de promover a língua portuguesa. Não é só promover a leitura, queremos promover a leitura em língua portuguesa e depois, nesta última instância, promover a língua portuguesa. É isso que estamos a fazer e é por isso que existe o projeto LITERANTO e outras diversas associações que promovem estes tipos de atividades, no fundo para a proteção e preservação da língua portuguesa, a língua que nos toca diretamente.
Cap Magellan: Tens hábito de trabalhar com crianças não é? Já foste professor? O quê que gostas tanto neste público?
Carlos Nuno Granja: Eu fui professor sim, professor de primeiro ciclo. Também estou a dar aulas no segundo ciclo. Mas, como gosto de dizer, sou professor em constante aprendizagem. O que gosto nas crianças é a curiosidade da descoberta. As pessoas dizem que as crianças e que os jovens não gostam de ler, mas gostam de livros. Não posso dizer qual é a porcentagem em Portugal mas eles gostam de ler livros. Acima de tudo, adoram o contato com o escritor. Ainda têm aquela inocência que já não tem os adultos, que já não valorizam. A sociedade portuguesa em geral não valoriza o trabalho intelectual. No entanto, as crianças adoram os livros, adoram o contacto com os escritores. Tive episódios onde lembro-me chegar numa escola e os miúdos do segundo ciclo já crescido a gritaram “veio de chegar o escritor Carlos Nuno Granja” e eu disse “tenho lá calma que não sou o Cristiano Ronaldo” e eles disserem “é como se fosse, para nós até é mais importante do que o Cristiano Ronaldo”. Os miúdos têm muito carinho pelos escritores, ainda têm esta inocência. Acho que as crianças têm um lado encantador que tem a ver com a curiosidade e o facto de tentarem perceber o porquê das coisas, etc. Um outro aspecto é a espontaneidade, a participação e o dinamismo das crianças porque os adultos não o são e não são os adultos que ensinam isso.
Cap Magellan: E tu Sara, já notaste este gosto pelos livros por parte das crianças e este carinho perante os escritores?
Sara Novais Nogueira:: Sem dúvida. Ainda hoje viu-se durante o espetáculo que o Carlos deu aqui na biblioteca em que os miúdos ficam encantados! Eles adoram ouvir histórias e não só as crianças: os adultos tornaram-se crianças! Todas as idades deveriam ouvir histórias infanto-juvenis. Nós, aliás, temos muito a aprender com os jovens e as crianças porque ensinamos mas aprendemos também.
Cap Magellan: Do que estou a entender deste projeto, não tem a ver só com a literatura ou com a língua portuguesa mas é fundamentalmente um todo. Estamos a aprender a ser realmente humanos. É esse o objetivo de LITERANTO?
Sara Novais Nogueira: Sem dúvida nenhuma. É por isso que costumo dizer que é dos 0 ao 100 por causa desta questão humanitária, dessa ligação familiar e umbilical que se cria entre as crianças e as famílias, os adultos que vêm as sessões e que se integram todos. Muitas vezes, os adultos revêem-se em certas histórias. Vir aqui, perder um bocado deste momento, trazer a sua criança – quer seja o seu filho/a, seu sobrinho/a ou que for – cria esse tal lado humano que é extremamente fundamental.
Cap Magellan: Carlos, já te aconteceu durante uma apresentação uma criança dizer que queria ser escritor?
Carlos Nuno Granja: Já muitas vezes. Tenho a certeza que a minha presença e aquela de outros escritores é fundamental nas escolas para promover a leitura e o gosto pela escrita. Para escrever é preciso muita dedicação; é um trabalho intelectual que exige concentração, determinação e o cérebro tem de funcionar. Ler põe a mente a trabalhar mas o gostar de ler tem de ser trabalhado. Comecei a escrever aos 9 anos, mas fui influenciado pela a minha mãe. Comecei a gostar muito de ler e aprendi a gostar de ler logo de imediato. Portanto, eu gosto muito de ler, aliás gosto mais de ler do que de escrever. Adoro ler.
Cap Magellan: Sempre ouvi dizer que um bom escritor tem de ser um excelente leitor.
Carlos Nuno Granja: E ser um excelente escritor já é quase ser um leitor estratosférico. Eu não consigo conceber um escritor que não seja um leitor, mas se calhar já aparecerem, se calhar já. Mas um escritor tem que ser leitor. Isso é fora de questão. Tem que ser leitor não pode ser de outra maneira.
Cap Magellan Carlos, quais são os teus futuros projetos?
Carlos Nuno Granja: Este ano apresenta-se como um grande ano para mim porque tenho pelo menos quatro livros infantis, um romance que estou a ver se consigo publicar e também livros terminados de poesia. Poderia aliás publicá-los já na próxima semana mas também continuo a escrever poesia. Igualmente, tenho projetos interessantes; um que tem a ver com a questão de ler para os adultos, pais e professores. Vão sair dois livros infantis agora em março e, com os livros da Horizonte, vai sair um novo livro em abril. Depois em junho tenho três novos livros e, em setembro, um novo livro infantil também. Este será um ano de afirmação talvez a nível nacional. Tenho também outros projetos que estou a pensar: eu gostaria de ter uma série juvenil que estou a escrever e vou propô-la a uma editora. A ideia que tenho é de escrever histórias juvenis para jovens e que depois se transformam numa história infantil e numa BD, numa novela gráfica.
Cap Magellan: E tu Sara? O futuro do LITERANTO?
Sara Novais Nogueira: Estou a aguardar agora algumas respostas de concursos que concorri para ver se temos as ditas verbas e se posso trazer outros autores. E depois, digo-te alguma coisa assim que souber quais são os próximos convidados para vir ao Literanto para que possam participar connosco novamente.
Cap Magellan: A minha última pergunta é uma pergunta que faço sempre no final de todas as minhas entrevistas: vocês têm uma mensagem final para os jovens lusodescendentes que vão ler a entrevista?
Carlos Nuno Granja: A mensagem é de não deixar cair a língua portuguesa e que se agarrem nela porque é uma mais valia. Falar várias línguas é sempre muito benéfico e muito positivo. Agarram na língua portuguesa, falam-na, leiam-a e espelham-a também pelas pessoas e por onde passam para permitir a preservação da língua.
Sara Novais Nogueira: Sem dúvida eu estou de acordo e acho que esses jovens têm de continuar a perpetuar a língua portuguesa: que leiam, que ouçam, que falam, que assistam a esses eventos que vão acontecendo em língua portuguesa. Se aprenderem o português como segunda língua poderá depois falar-lá pelo mundo todo, quer a nível profissional quer a nível pessoal. Acho que é sempre uma mais valia. Portanto falam português!
Cap Magellan: Muito obrigada Sara e Carlos! Estou ansiosa por conhecer os próximos eventos.
As sessões de apresentações de LITERANTO estão sempre anunciadas pela Fundação Calouste Gulbenkian. Não hesite em prestar atenção às novas datas!
Entrevista realizada pela Julie Carvalho,
de Os Cadernos da Julie
Transcrição pela Sophie Abreu.