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16 octobre 2024Interview de Claire Luzi
17 octobre 2024A fadista Lina é chamada fadista de Camões. Isto explica-se pela publicação do seu último disco: Fado Camões. Um disco premiado várias vezes, cujo sucesso já não é para provar. Lina estará em Paris, no dia 23 de Outubro de 2024, para atuar num concerto inédito no Café de la Danse. Cap Magellan estará presente e quis fazer algumas perguntas à artista.
Cap Magellan: Ola Lina! Espero que esteja tudo bem contigo. Faz 4 anos que cantas sobre o teu nome, Lina, desde a saída do álbum com o Raul Raül Refree. Os dois primeiros álbuns foram publicados sob o nome de Carolina. Porquê?
Lina: Antes do Carolina eu já tinha feito coisas em nome próprio. Mas na altura, quando assinei com a editora, eles acharam que Lina era muito pequenino, então acabaram por me incentivar a colocar um outro nome. Por isso é que surgiu este Carolina. Lembro-me da minha mãe dizer que quando eu nasci, um dos nomes que ela gostava de me pôr era Carolina. Mas depois acabou por ficar Lina. Talvez porque eu nasci na Alemanha. Na altura, em 1984, os bebés tinham os mesmos nomes das madrinhas ou dos padrinhos. E eu fiquei com o mesmo nome da minha madrinha. Ok.
Cap Magellan: Como é que decidiste voltar ao teu nome próprio?
Lina: Comecei a trabalhar com o Uguru há cinco anos, praticamente, e achamos que Lina permitiria sentir a minha identidade verdadeira. O facto de me chamarem Carolina e não sendo Carolina acabava por criar uma barreira invisível que se calhar era prejudicial em termos de personalidade.
No entanto, orgulho-me muito pelos dois discos com o nome Carolina, porque mostra o início da minha carreira e são dois álbuns dos quais gosto e que acho muito bem produzidos.
Cap Magellan: Voltando ao início, quando é que começaste mesmo o fado e porquê?
Lina: Eu comecei desde criança, porque ouvia sempre o meu pai a cantar fado. Ele adora os fados da Amália, os fados do Alfredo Marceneiro, gosta muito de fado. A música dele é um fado, sempre foi e sempre será.
Além disso, quando eu tinha 15 anos, ocorreu o falecimento da Amália. Houve todo aquele movimento das pessoas, das televisões, havia uma corrente enorme sobre a morte da Amália. Todas as televisões passavam as músicas da Amália e a minha mãe acabou por comprar alguns discos dela. Comecei a tentar cantar os fados dos discos dela. Acabei por me fechar no quarto e tentar aprender os fados de uma ponta à outra, com as voltinhas todas. A Amália acabou por ser a minha escola inicial de fado.
Cap Magellan: Estás agora numa turnê europeia com o fado Camões. Como é que nasceu a ideia?
Lina: Olha, a ideia nasceu ainda em 2021, mais ou menos quando eu e o Raul estávamos em turnê. Acabo por pensar sempre para além do disco que estou no momento a cantar, acabo sempre por começar a pensar no próximo. Uma vez que eu gosto de fazer álbuns com o conceito de não ser um álbum de músicas avulsos só porque se gosta das músicas e porque se decidem cantá-las naquele disco, eu prefiro fazer um fio condutor, onde haja um conceito e uma coerência do disco, que seja uma obra que tenha uma história. Surgiu uma frase muito interessante da Amália que dizia que o Luís de Camões era o seu poeta preferido. Questionei-me e fiquei curiosa em conhecer um bocadinho mais sobre Camões. Não só os sonetos, mas também uma obra vasta sobre a lírica de Camões. E quando comecei a ler os seus poemas percebi que havia uma grande proximidade com a temática dos fados e com algumas semelhanças na estrutura do fado tradicional.
Foi por aí que comecei a investigar e perceber se tinha material para conseguir fazer um álbum com a lírica de Camões, juntamente com os fados tradicionais.
Cap Magellan: Foi mesmo um grande trabalho de adaptação dos poemas ao fado tradicional. Consegues escrever música ou é tudo pela orelha?
Lina: Tenho formação musical, mas para mim a parte mais emotiva e mais automática, ou seja, mais fácil, acaba por ser a parte do ouvido, de cantar o ar e de gravar aquilo que cantei. As vezes fica uma melodia na cabeça e eu gravo para não esquecer dela porque posso um dia voltar a ouvi-la e achar que cabe em algum poema que li, ou estar ao mesmo tempo a ler e a imaginar a música para aquelas palavras. Eu prefiro fazê-la intuitivamente do que escrevê-la. Não que não saiba fazê-lo, mas eu prefiro também a parte de cantar e encaixar a música nas palavras.
Cap Magellan: Achas que o teu álbum Fado Camões permite popularizar Camões?
Lina: Olha, eu acho que pode ajudar a entender a sua escrita. Quando nós estamos parados na escola com Os Lusíadas, não sei se é vantajoso para a idade em que começamos a estudar Camões. Acho que é um pouco difícil de entender a sua escrita: provavelmente não temos a maturidade suficiente para entender a poesia de Camões na altura em que é lecionada. Creio que este disco possa ajudar a mostrar interesse por Camões aos alunos e tornar a sua poesia algo mais fácil e mais direta de se entender.
Camões é maravilhoso na escrita. Já gostava de Camões, mas quando estudei mais profundamente, como foi o caso deste álbum, percebi que havia formas de ele escrever que mais nenhum poeta tem. O facto de ele introduzir rimas dentro do próprio verso, brincar com as palavras, as contradições dentro do próprio verso, é muito interessante. Fiquei completamente rendida a Camões e hoje percebo que quando leio outro poeta sinto que falta algo, que há alguma magia que Camões nos deu e acho que pode ser um bocadinho mais explorado nesse sentido.
Cap Magellan: Já venceste vários prémios com esse álbum e até foste nomeada para as Victoires du Jazz. Qual é a importância dos prémios para um álbum musical?
Lina: É um motivo de grande orgulho, quer dizer que valeu a pena todo o esforço e fico feliz por lá fora ter essa repercussão. É o terceiro melhor álbum no meio de 100 do ano inteiro, é espetacular, é muito bom para mim e estou muito grata a todas as pessoas que gostam da minha música e que me apoiam neste sentido.
Cap Magellan: Já passaste por Paris este ano, em março, no Studio de l’Ermitage. Como é que foi?
Lina: Foi espetacular! Foi muito bom, acho que as pessoas gostaram bastante e foi um concerto bastante intimista. As pessoas adoraram e eu fiquei muito contente por esse facto. Foram muito acolhedoras.
Cap Magellan: É assim que descreverias o público parisiense, então? Achas que vai ser a mesma coisa no Café de la Danse, dia 23 de outubro?
Lina: Espero bem que sim. Vou tentar falar um bocadinho de francês, mas acho que vai ser interessante também.
Cap Magellan: O público parisiense, o público francês que tens, é só português ou também muitos franceses?
Lina: Não, curiosamente a maioria são franceses. Não sei explicar, mas lá fora o meu público é local. Em todos os países onde eu tenho ido, todo o público é local. Claro que em Paris havia alguns portugueses, e há sempre um ou outro português. Mas 90% da audiência são franceses.
Cap Magellan: Depois da turnê europeia, o que é que tens previsto? Estás a trabalhar num novo disco?
Lina: Sim, já está feito. Já tenho planos para um novo disco, que há de ser uma parceria com o Jules Maxwell, dos Dead Can Dance, que é um irlandês, músico e compositor, e vai ser esse o próximo passo. Vai ser um álbum, uma partilha de música entre mim e o Jules Maxwell.
Cap Magellan: Gostas muito de trabalhar com outras pessoas, de outras culturas também?
Lina: Sim, é importante fazer este tipo de caminho. Eu acho que, ao fazeres um disco com outras pessoas, acabas por conhecer outras culturas, outras formas de pensar na música, outras sensibilidades e isso enriquece-me. Portanto, eu adoro trabalhar com pessoas, adoro fazer parcerias na música e para mim faz todo o sentido.
Cap Magellan: Para acabar, a pergunta que faço em todas as minhas entrevistas é: tens uma mensagem geral para os jovens lusodescendentes?
Lina: Não é só para os jovens: acreditar, ou seja, lutar por aquilo em que acreditam. Acho que é muito importante nós sonharmos com algo e tentarmos fazer o máximo para que esse sonho aconteça e nunca desistir. Independentemente da sociedade em que estamos a viver, e ligarmos um bocadinho mais uns aos outros. Estarmos mais conectados com quem está ao nosso lado. Não estar tão focado nas redes sociais, porque isto tem sido um problema sistemático. Olhem mais à vossa volta e vejam com olhos de ver, sintam as coisas.
Cap Magellan: Muito obrigada Lina! Convido toda a gente a comprar os seus bilhetes para o teu concerto dia 23 de outubro.
Convidamos toda a gente a assistir ao concerto dia 23 de Outubro no Café de la Danse. Compra os seus bilhetes.
Pode seguir Lina nas suas redes sociais: Instagram, Youtube, site.
Entrevista realizada pela Julie Carvalho,