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3 mai 2024Appel aux musiciens luso pour la fête de la Cité
3 mai 2024Quando a selecção nacional de futebol masculina estava em campanha para conquistar o título do Campeonato da Europa 2016, nas televisões em Portugal surgia sempre a mesma frase nos anúncios alusivos a essa campanha “11 milhões a puxar por Portugal.”. Par<a mim esta frase é uma meia-mentira, porque efectivamente o território nacional tem aproximadamente 10 milhões e qualquer coisa, mas os portugueses são muito mais do que aqueles que moram nessa terra à beira-mar com uma das melhores qualidades de vida do planeta. Portugueses são todos aqueles que estão também a viver em França, África do Sul, Venezuela, Brasil, Índia, Estados Unidos da América, entre vários outros locais.
Ninguém me pode dizer que o Raphael Guerreiro ou o Mike Tadjer não são portugueses, apesar de terem jogado por Portugal e elevado o nome do país à sua glória total. É falso e, acima de tudo, é deixar que as narrativas inventadas pela extrema-direita portuguesa e francesa dominem a definição de quem é português-francês.
Olhemos para isto de três formas: económica, social e humana. A económica prende-se com a subida de rendimento das selecções nacionais de qualquer índole, seja masculino ou feminino, seja futebol, râguebi, andebol ou basquetebol. Quanto melhor for a base de convocados de um conjunto nacional, mais possibilidades terá essa seleção de chegar aos pódios e conquistar metas. Isto não significa que a formação nacional deve ser desinvestida, já que as duas situações devem coabitar juntas. Basta que todas as partes sejam honestas e explicar a importância de ter atenção com aqueles atletas luso-descendentes (seja de que país forem) que tenham o desejo de representar Portugal.
Com mais atletas, Portugal vai estar mais próximo de formar seleções de maior qualidade e com isso vai atrair ainda mais adeptos que, ao verem um luso-francês que nasceu, por exemplo, em Carcassonne e singrou ao mais alto nível, podem querer seguir o mesmo caminho e assim contribuir para o crescimento de Portugal.
No fator social, ao existir uma ligação forte com as comunidades portuguesas no estrangeiro, poderemos ter um desenvolvimento humano mais perene e com condições de poder demonstrar que Portugal se importa com as suas gentes, mesmo aquelas que emigraram à procura de melhor sorte há décadas atrás. Com a criação de cursos de língua e cultura portuguesa – seja online ou presencial – apoiados pelo Governo português, poderia aqui suscitar uma porta de entrada importante que tornaria Portugal num país mais convidativo para com a sua diáspora, que muitas vezes tem pouca noção real do que se passa no território nacional. Por outro lado, teria de encontrar forma de conseguir ouvir estas comunidades e de desenvolver algum mecanismo que contasse as suas histórias para os que vivem em Portugal.
Finalmente, a parte mental. Todos aqueles que disserem que não sentem nada quando vêem alguém como Mike Tadjer, Samuel Marques, Nicolás Martins, Francisco Fernandes, Vincent Pinto, entre outros, a cantar o hino e a elevar a voz, mostrando uma emoção igual aos seus pares que nasceram em Portugal, estão a mentir. Muitas vezes os países tratam as suas antigas comunidades como algo de pouca importância, não sabendo sequer quantos são, o que fazem, ou o que Portugal significa para cada um desses. A humanidade de perceber as experiências de cada um e senti-las é fundamental para começarmos a perceber o que Portugal significa para esses luso-descendentes, podendo servir de lição para todos aqueles que tomam ser português como um dado adquirido.
Nisto tudo há uma questão que impera na cabeça daqueles que duvidam de tudo: o nascimento e crescimento. De forma mais simples “eles não nasceram em Portugal, são lá portugueses! Nem a língua sabem falar ou cantar o hino”. Por isso, a portugalidade de uma pessoa é definida só pelo local de nascimento e a maneira como cresceu, e não por aquilo que sente ou o interesse em representar um país ao qual está ligado por sangue e família. Isto é muito fácil de desmascarar, pois há muito português nascido em Portugal que passa a vida a dizer mal deste bocado de terra, cuspindo na sua direção e a ter considerações falsas. Mas como nasceu por acaso em Portugal, e sabe cantar o hino, é português. Contudo, alguém que nasceu noutro país e cresceu a ouvir histórias de Portugal, a visitar o país que foi dos seus pais, tios, avós, primos ou irmãos e que veste a camisola e faz um esforço para tentar aprender português mesmo não sendo fácil, não é e nem merece ser considerado parte de Portugal, de acordo com essas pessoas.
Uma mentira repetida mil vezes jamais será uma verdade e é importante que as comunidades luso-descendentes, especialmente a luso-francesa, lutem constantemente contra isto porque efetivamente fazem parte de Portugal. Olhar para Francisco Fernandes e ouvi-lo a cantar o hino e a lutar pela selecção nacional com 38 anos de idade é uma demonstração de paixão que uns quantos deputados da Assembleia de República Portuguesa jamais conseguirão perceber ou sentir.
Portugal precisa de todos os luso-franceses, sejam atletas e adeptos ou jogadores, e o que foi feito no Mundial de Râguebi 2023 foi uma pequena demonstração daquilo que juntos podemos conseguir, com mais trabalho, apoio e solidariedade: grandiosidade! Estar no Estádio de Toulouse e ouvir vinte e tal mil portugueses a cantar o hino e a gritar “Portugal, Portugal, PORTUGAL” durante 80 minutos com os 23 jogadores a carregar a equipa para um empate histórico frente à Geórgia é uma imagem que para mim demonstrou a dimensão da alma portuguesa.
Não sei quem foi o primeiro luso-descendente a jogar por Portugal, seja em râguebi, futebol ou outra seleção, mas sei que todos eles transmitem a mesma emoção, carinho e querer, sendo tão ou mais portugueses do que eu, que nasci em Lisboa e à beira-rio. A todos eles, um bem-haja e um bem-vindos, este é também o vosso país.
Francisco Isaac, jornalista desportivo especializado no rugby e outras modalidades
Article issu du CAPMag de mai 2024
Publié le 03/05/2024