Interview de Patrick Straumann
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25 novembre 2024No dia 6 de novembro de 2024, a Cap Magellan foi convidada na press release do espetáculo Luis de Matos IMPOSSIBLE Sur Scène na Folies Bergère. Obviamente, quisemos mais informações.
Cap Magellan: Boa tarde, Luís. Espero que esteja tudo bem contigo. Estamos na sala Folies Bergère, sala na qual atuas do dia 8 de novembro ao dia 1 de dezembro para o teu espetáculo, Luis de Matos IMPOSSIBLE Sur Scène. Porquê Paris?
Luis de Matos: Não só Paris, mas esta sala em especial. Em 2016, no âmbito de uma digressão internacional, tivemos um mês aqui na Folies Bergère. De todas as salas que eu conheci, para mim a sala mais mágica, mais especial, foi e continua a ser a Folies Bergère. Por uma razão muito simples: apesar de ser uma sala que leva mais de mil e quinhentas pessoas, é uma sala onde, em qualquer sítio que tu te sentes, tens uma visão privilegiada do que acontece no palco e sentes uma grande proximidade relativamente a tudo o que se passa em cima do palco. Isso é o ideal para um espetáculo que estimula todos os sentidos. Portanto, é o sítio ideal para podermos estimular a curiosidade sonhada, para desafiarmos a imaginação, de uma forma espetacular e surpreendente, como acho que acontece neste espetáculo.
CM: O espectáculo é descrito como sendo uma epopeia. Porquê esse nome, epopeia?
LM: Na verdade, é muito singular que cinco mágicos se unam em torno de um projeto. Não tenho memória de que isso tenha acontecido no passado. Existem espetáculos em que vários atores são contratados, mas aqui há um ambiente especial em que cada um desses cinco quer fazer o seu melhor, em que nos damos todos tão bem, em que ficamos felizes com o sucesso de cada um. Até existem vários momentos do espetáculo em que fazemos magia em conjunto. Procuramos realmente fazer o que ainda não foi feito, procuramos que toda a boa energia que se sente entre equipa (eléctricos, bastidores, equipa de autoridade geral) seja transmitida no palco. Fazemos todos um esforço enorme diariamente de estar aqui das sete da manhã à meia-noite a tentar fugir e fazer o melhor, estar atento para que tudo no dia da estreia corra bem, para que durante estas quatro semanas muitas pessoas possam ter acesso a um espetáculo completo. Cada um destes cinco artistas nos seus países de origem também têm espetáculos unipessoais. Qualquer pessoa pode assistir ao espetáculo do Aaron Crow, do Dan Sperry, do Norbert Ferré ou do Yu Hojin. Aqui nós escolhemos o melhor de cada um quase como uma celebração desta contemporaneidade que caracteriza este projeto.
CM: Como já disseste, não estás sozinho no palco, estás com quatro mágicos do mundo inteiro, então o Aaron Crow da Bélgica, o Dan Sperry dos Estados Unidos, o Norbert Ferré da França e o Yu Hojin da Coreia do Sul. Como é que nasceu a ideia de pôr cinco mágicos de toda a parte do mundo num espetáculo único?
LM: Na verdade, o espetáculo surge como uma consequência de uma série que fizemos para a RTP em 2017 chamada Luis de Matos – Impossível. Era feita através dos nossos estúdios, em directo RTP. Tinha público ao vivo com 200 pessoas, candidatos do mundo inteiro, mágicos incríveis, etc. As pessoas inscreveram-se para assistir em direto e o que aconteceu foi que, rapidamente, na primeira semana, chutavam as plateias de todas as sessões da televisão. Mas, ainda assim, as pessoas insistiam e vinham a ter até ao Estúdio 33. Vinham de toda a parte do país, do norte e do sul, na esperança de que houvesse lugar. Não havendo lugar, estacionavam no parque de estacionamento do Estúdio 33, onde pusemos televisores. Percebemos que existiam muitas famílias em toda a parte do país que, na verdade, acabavam por ficar no parque de estacionamento enquanto podiam ver o show na sua casa. Em 2018 tentamos fazer isto como um espetáculo ao vivo nos teatros, inicialmente em Lisboa.
E correu muito bem. Voltamos a fazê-lo no ano seguinte, e no ano seguinte, e no ano seguinte, sempre, todos os anos. Estávamos sempre a renovar o espetáculo, trazendo novas ilusões. O que acontece é que as pessoas vêm, aproveitam isto, porque sabem que o espetáculo se reinventa, se altera, mas quando voltam, já convencem mais dois amigos a vir, além de mais três membros da família. Assim, temos sempre mais e mais público.
Acho que é isso que torna este projeto absolutamente extraordinário para nós: é esta surpresa permanente de perceber que há mais e mais pessoas cada ano. Também se converte num grande desafio: tentamos que seja sempre melhor do que no ano anterior.
CM: Qual vai ser a língua do palco?
LM: A língua do palco é uma linguagem universal. A maior parte dos momentos do espetáculo nem sequer são falados, principalmente porque é um espetáculo familiar e porque é um espetáculo de emoções. É um espetáculo onde uma criança de seis anos sente de maneira diferente do que o adulto de setenta, mas ambos levam para casa a memória, a experiência, o sentimento de terem visto algo extraordinário, invulgar, belo, incrível e inexplicável. Mesmo assim, vou tentar o meu melhor francês, portanto, quando se fala é em francês.
CM: Sentes uma diferença entre o público português e o público de fora?
LM: Não. Acho que o público é, de uma forma geral, igual na forma de agir. Provavelmente para outras formas de expressões artísticas, existem diferenças geográficas. No caso da magia, todos nós sabemos que isto é surpreendente e aquilo é extraordinário. Faz parte do nosso conhecimento. Significa que, em qualquer parte do mundo, todos nós conhecemos as regras do jogo.
Aquilo que eu noto fundamentalmente é uma diferença em que normalmente os mais novos estão perfeitamente entregues ao jogo e à imaginação. Nós sabemos que é mentira e é por isso que acontece de uma forma surpreendente. Os adultos, eles, começam, nos primeiros cinco minutos, a querer descobrir como é que isto é feito. Rapidamente percebem que é muito mais divertido entrar nesta onda e que provavelmente não iriam descobrir e iriam guardar uma memória pouco simpática. Finalmente, é melhor, desde o princípio, guardar a capacidade de sonhar e desafiar a imaginação para poder, durante duas horas, fazer literalmente o que é impossível. Nem sempre acontece só no palco: existem momentos que acontecem nas mãos das pessoas, momentos de magia interativa, momentos em que estamos juntos, nós próprios. Enfim, é muito surpreendente, são duas horas de uma verdadeira montanha-russa, a montar aos limites dos sonhos.
CM: Foste conhecido pelos teus shows na RTP, mas como é que tudo começou? Como tornaste-te ilusionista?
LM: Começou como a maioria das profissões: quando somos miúdos, há uma altura das nossas vidas em que queres ser isto e aquilo, jogador de futebol, astronauta, bombeiro, músico, médico, advogado. Isto muda todos os dias ou quase. No meu caso, eu ainda quero ser mágico e tenho a sorte de ter escolhido trabalhar numa área que gosto tanto. Quando se passa a vida a ter prazer, não se sente tanto o trabalho como um trabalho. Vou todos os dias entusiasmado ao trabalho, todos os dias são diferentes, todos os dias posso ter a sorte de criar uma nova ilusão, ou ter a sorte de poder completar uma que está pronta para trabalhar com o público.
CM: A primeira ilusão que fizeste foi aos 11 anos. Como aprendeste?
LM: Numa das fases da minha infância, fazia parte do teatro e tocava viola. Havia um de nós que fazia magia, era o único. Aprendi com ele alguns truques, porque ele tinha imenso interesse e foi muito generoso comigo. Aprendi com ele as primeiras ilusões. Depois, interessei-me, passei a ir a festivais, continuei a procurar informações, a formar-me. Aprendi com os meus próprios erros e aprendi que tudo pode acontecer.
CM: Recebeste vários prémios. Aliás, és Comendador da Ordem do Infante D. Henrique em 2014. O que representam estes prémios para ti?
LM: Obviamente, sou muito grato por todos os prémios que ganhei, ainda que normalmente eu não me fixo muito a interiorizar o que é que são os prémios. Por definição, os prémios chamam a atenção para um trabalho que já foi feito, um trabalho que fiz há algum tempo. Sempre que isso acontece, apanha-me num momento em que estou mais preocupado, mais entusiasmado, em fazer um trabalho melhor do que o que eu já fiz. Portanto, os prémios são sempre muito importantes para a nossa autoestima, para partilhar com a equipa, para o próprio respeito que as pessoas têm sobre o nosso curso, sobre a nossa carreira, mas parece que não fui eu, que era um Luís do ano passado.
CM: Como é que consegues fazer sempre outra coisa, ir sempre mais além?
LM: Tudo aquilo que fazemos é sempre uma mistura, um equilíbrio entre a ambição e a humildade: a ambição de fazer o que nunca foi feito e a humildade de conhecer o que não conseguimos fazer. É sonhar com 100 para só conseguir fazer 80. Temos que ter a ambição de fazer o que ainda não foi feito e a humildade de dizer que não conseguimos totalmente mas que só pelo facto de ter tentado já valeu a pena. É o que inicia a história da minha vida: tentar fazer o que ainda não foi feito, sobretudo porque isso também me diverte, me motiva e eu acho que é uma espécie de desconforto que se tornou confortável.
CM: Criaste o Estúdio 33 em Ansião. O que significa este projeto?
LM: Foi um projeto enorme: encontrar a casa certa para uma equipa que comecei a construir em 1995. Estamos juntos há 15 anos e na altura estávamos repartidos em varios lugares o que fazia com que ficava uma semana num sitio, outra semana noutro, etc. Pensei que seria incrível trabalharmos todos os dias no teto e construímos um equipamento à medida daquilo que nós fazemos. O Estúdio 33 é uma caixa aberta à porta fechada: é uma caixa aberta a tudo aquilo que a gente queira lá fazer, tudo aquilo que a imaginação determinar ; é à porta fechada porque não foi patrocinado, não teve dinheiro europeu, não teve dinheiro do governo, foi construída pelo nosso trabalho, desenhado por nós e é onde nós trabalhamos todos os dias.
O trabalho é divertido mas também pode ser muito duro. Ficamos horas e horas no estudio, com pressao. Estar todos juntos nesse teto permite boa energia, conversar sobre as ideias, divertir-nos, etc.
CM: Para acabar, a pergunta que faço sempre no final das minhas entrevistas: tens uma mensagem para os jovens lusodescendentes?
LM: Temos a sorte de viver num mundo onde há menos fronteiras, num mundo onde nós podemos crescer, conhecer, aprender. Aprender é das coisas mais belas que o ser humano tem. Não conhecemos o limite da nossa memória. Alias, historicamente os portugueses foram um povo que sempre ensinou: ensinou capacidade de trabalho, ensinou uma certa humildade, ensinou também uma certa festa. Há coisas que nos tornam únicos na nossa simpatia, na nossa forma de perceber, na nossa curiosidade de conhecer marcada na história do próprio país. Portanto acho que ser lusodescendente e ser jovem são suavemente dois aspectos que devem fazer com que todas as pessoas que têm essa condição tenham muito entusiasmo ao acordar e que comam o mundo inteiro!
Para terminar, gostava que viessem ver o IMPOSSIBLE Sur Scène. Sou um lusodescendente a viver em Portugal, a viajar pelo mundo. Estou em Paris este mês, até dia 1 de dezembro e trazemos um espetáculo literalmente made in Portugal. É algo absolutamente inédito e singular para um espetáculo feito, criado e construído em Portugal. Se poderem mostrar o vosso carinho, nós vamos seguramente atribuir um dobro. Vamos fazer com que valha a pena estarem connosco e vamos também fazer com que tenham orgulho de que este espetáculo tenha sido feito em Portugal!
CM: Já temos orgulho Luis. Parabéns pelo trabalho!
Compre os seus bilhetes para o espetáculo no site da Folies Begère ou no site do espetáculo.
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Entrevista realizada pela Julie Carvalho