A candidata Joana Carvalho do partido CDU responde às nossas perguntas
14 février 2024O candidato Carlos Gonçalves do partido Aliança Democrática responde às nossas perguntas
14 février 2024Apresentamos as respostas completas de Rita Nóbrega, candidata n°1 e Luís Lopes, candidato n°2, pelo Bloco de Esquerda ao círculo Europa:
Participação eleitoral dos Portugueses no estrangeiro
Cap Magellan: Como pretende promover a participação eleitoral dos Portugueses no estrangeiro tendo em conta a abstenção de 88.6% nas últimas legislativas?
Rita Nóbrega, Bloco de Esquerda: Apesar da duas excelentes e bem-sucedidas iniciativas do BE, a recente criação do recenseamento eleitoral automático na área de residência do emigrante e da gratuitidade do voto, a participação eleitoral é de facto reduzida e muitas vezes sujeita a percalços e complicações.
Um aspeto que nos parece básico é evitar erros semelhantes aos que aconteceram no último ato eleitoral em relação aos votos postais e que aumentaram ainda mais o número de eleitores que não se viram representados.
Existem medidas concretas no programa eleitoral do Bloco, que irão contribuir para aumentar a participação eleitoral, nomeadamente: o aumento das assembleias eleitorais nos consulados para exercício do voto presencial; o reforço do uso do voto postal e a proposta de teste de voto eletrónico à distância.
Em termos de nossa campanha e da parte da nossa lista ao círculo europeu, estamos a planear várias ações nas zonas de maior presença de emigração portuguesa. O tempo que temos para preparar a campanha e as ações presenciais é limitado, principalmente tendo em conta que o voto por correspondência começa já no início de Fevereiro, mas vamos fazer os possíveis para contactar pessoalmente com o maior número possível de pessoas, complementando com iniciativas online, de forma a promover o debate e a participação eleitorais.
Cap Magellan: Qual é a seu ver o peso eleitoral dos emigrantes e luso-descendentes ?
Rita Nóbrega, Bloco de Esquerda: O peso eleitoral deveria ser proporcional à população emigrante, mas tal não se verifica e é na prática e infelizmente muito reduzido. Para quase um milhão e meio de emigrantes na Europa, este círculo apenas elege dois deputados, que são inevitavelmente PS e/ou PSD. Isto traduz-se num sentimento de falta de representatividade e de significado do voto individual, que contribui para um certo desinteresse e para a enorme abstenção de que falávamos antes. Apesar destas limitações, esperamos mobilizar um grande número de votantes com as ações que temos programadas para esta campanha eleitoral.
Cap Magellan: O que tem a dizer sobre os diversos problemas encarados pelos cidadãos portugueses no estrangeiro no que diz respeito ao ato eleitoral?
Rita Nóbrega, Bloco de Esquerda: Perante assuntos que são da responsabilidade do Estado Português e tal como noutras áreas, os portugueses no estrangeiro devem ter os mesmos direitos dos que vivem em território nacional e é obviamente essencial que isto se aplique ao fundamental direito de voto. Algumas das propostas atrás referidas tentam solucionar este problema.
Equilíbrio na representação eleitoral e relações com a Europa
Cap Magellan: No contexto das próximas eleições europeias, de que maneira pretende desenvolver as relações do país com o resto da Europa? Tanto a nível sócio-cultural como político?
Rita Nóbrega, Bloco de Esquerda: O nosso país deveria ser, na Europa, uma voz ativa – e menos submissa – na promoção da democracia, liberdade e solidariedade. Perante o infeliz e perigoso crescimento de movimentos políticos de intolerância e ódio, é cada dia mais importante a firmeza na defesa dos direitos das minorias, dos migrantes e das mulheres e no combate à emergência climática, que têm desde sempre sido objetivos centrais na ação política do Bloco e dos nossos parceiros políticos da esquerda europeia.
A relação com os restantes países europeus nem sempre tem de ser de alinhamento total. Neste momento é, por exemplo, incompreensível a recusa do Governo em reconhecer o estado da Palestina autonomamente, sem esperar por autorização da União Europeia.
Do ponto de vista do sistema financeiro, seria benéfico que a relação fosse mesmo de maior autonomia em relação ao tratado orçamental e às prioridades muitas vezes erradas da política monetária europeia, que tanto tem penalizado, por exemplo, as pessoas dependentes do crédito à habitação. Para um aumento da justiça fiscal, o BE defende um limiar mínimo para a tributação dos rendimentos de capital em todos os Estados-membros e territórios da União Europeia.
No que toca à cultura, o Bloco tem desde sempre defendido um maior apoio (incluindo uma maior percentagem do PIB) às atividades culturais e aos seus profissionais. Parte desse apoio deve partir de fundos e programas europeus que fomentem a cooperação entre agentes culturais dos diversos estados-membros, bem como a distribuição e promoção de projetos culturais a nível europeu.
Cap Magellan: Dos de 230 deputados da Assembleia da República, apenas 2 representam o círculo eleitoral da Europa: Como pretende através de apenas 2 deputados do círculo europeu representar os cerca de quase 1 milhão de eleitores?
Rita Nóbrega, Bloco de Esquerda: É importante esclarecer que todos os 230 deputados da AR representam a totalidade dos cidadãos portugueses, independentemente do círculo pelo qual tenham sido eleitos. É tendo em conta este princípio fundamental que o Bloco de Esquerda nunca se escusou da sua responsabilidade perante os portugueses residentes no estrangeiro, mesmo sem ter conseguido assentos parlamentares pelos círculos da emigração. Apresentámos, por exemplo, um projeto de lei que visava a eliminação da propina para o Ensino de Português no Estrangeiro (EPE) e a garantia de gratuitidade dos manuais escolares adotados. Esse diploma foi rejeitado pelo voto contra do PS (e abstenções do PSD e IL), incluindo de ambos os deputados eleitos por esse partido para o círculo da Europa.
Foi também o PS a introduzir as alterações ao Registo Nacional de Utente que ditam o fim do acesso dos portugueses residentes no estrangeiro aos cuidados continuados de saúde e o acompanhamento por um médico de família – medidas imediatamente contestadas pelo Bloco.
Ora, se é verdade que cada um dos deputados representa a totalidade dos cidadãos, também é verdade que se pressupõe que exista por parte das deputadas e deputados eleitos por cada círculo um conhecimento mais profundo da realidade do mesmo, que lhes permite apresentar e contribuir em propostas que respondam às preocupações e necessidades da população que os elegeu. No entanto, quando comparamos as votações dos deputados eleitos pela emigração com a dos deputados do Bloco de Esquerda, percebemos quem tem assumido realmente o papel de representação dos emigrantes portugueses.
O Bloco já representa os eleitores do círculo europeu, e com deputados eleitos por este círculo poderia reforçar ainda mais a defesa das comunidades portuguesas na Europa, por contar com pessoas que fazem parte dessas comunidades na linha da frente do processo legislativo, a apresentar medidas para defender o EPE, o acesso ao SNS, o reforço da rede consular e a promoção e acesso à cultura portuguesas.
Cap Magellan: A seu ver deve ser equilibrada a proporcionalidade entre o número de eleitores e o número de deputados eleitos pelo círculo eleitoral europeu?
Rita Nóbrega, Bloco de Esquerda: Sim. Não faz qualquer sentido que o círculo eleitoral europeu seja o terceiro círculo com mais votantes inscritos e só eleja dois deputados. Há que reconhecer o peso da emigração na população portuguesa e a ligação que os portugueses residentes no estrangeiro ainda sentem ao país, bem como o seu direito, constitucionalmente reconhecido, de contribuir para as decisões que moldam o seu futuro. Se faz sentido que a proporção não seja semelhante à dos círculos nacionais, já que a distância também nos “escuda” de parte do peso das decisões tomadas pela AR eleita, também não deixa de ser absurdo que um círculo onde vivem tantos portugueses eleja tão poucos assentos parlamentares. Para além disso, é antidemocrático: Quando se limitam tanto os mandatos atribuídos a um dado círculo eleitoral, fomenta-se a lógica do “voto útil”, que impede tantos eleitores de votarem nos partidos pelos quais realmente se sentem representados.
Cap Magellan: Que propostas/medidas desenvolveria de modo a originar a implementação de uma reforma hipotética no sistema político atualmente em vigor no que diz respeito à presença das comunidades Portuguesas no estrangeiro?
Rita Nóbrega, Bloco de Esquerda: Algo que nos parece essencial, tanto para as comunidades portuguesas no estrangeiro como para os cidadãos residentes em círculos que elegem poucos deputados, é a implementação de um círculo de compensação. É inaceitável que tantos votos válidos não contem para eleger um único deputado – há distritos onde mais de metade dos votos expressos não têm representação parlamentar. Isto atenta contra o princípio da igualdade e contra a própria democracia, já que certos votos contam mais do que outros. Um círculo de compensação, não corrigindo totalmente essa disparidade, atenua-a significativamente. Para além disso, como referido anteriormente, faz sentido rever a proporcionalidade do número de deputados nos círculos da emigração.
Por fim, alocar recursos que permitam reforçar a proximidade dos portugueses residentes no estrangeiro com o Conselho das Comunidades Portuguesas (CCP), de forma a que todas e todos se sintam representados por este e a aumentar a participação eleitoral nas suas eleições. Este é o órgão consultivo do Governo para todas as políticas que dizem respeito à diáspora portuguesa e, no entanto, pouca iniciativa existe por parte dos sucessivos governos para garantir que os portugueses residentes no estrangeiro estão familiarizados com a missão do CCP e com o direito que têm de eleger os seus conselheiros.
Apoio aos jovens portugueses na Europa
Cap Magellan: As competências dos jovens portugueses acabam por passar despercebidas levando a taxas de emigração nunca antes vistas. De que maneira pretende incentivar os jovens portugueses a investirem na sua presença em Portugal?
Rita Nóbrega, Bloco de Esquerda: O investimento na retenção (ou a promoção do regresso) de jovens em (ou para) Portugal deveria ser uma preocupação e prioridade para o Governo. O programa eleitoral do BE inclui várias medidas para melhorar salários e condições de trabalho e uma ênfase muito grande no controlo da crise da habitação, que em conjunto com os baixos salários e a precariedade contribuem fortemente para a saída de jovens qualificados. Apenas um exemplo é a área da Ciência e Ensino Superior, de onde emigra anualmente uma percentagem enorme de licenciados e doutorados. O BE tem no seu programa várias propostas nessa área, incluindo uma afetação do PIB de pelo menos 3% em Ciência e Investigação, que tem sido sujeita a um crónico e dramático subfinanciamento.
Cap Magellan: Segundo dados do Observatório de Emigração, um em cada três jovens nascidos em Portugal vive fora do país: de que maneira pretende garantir que os jovens portugueses encontram melhores condições de vida em território nacional ?
Rita Nóbrega, Bloco de Esquerda: Os fatores fundamentais foram focados na pergunta anterior. Habitação e condições de emprego estáveis são a chave. Mas em complemento, existem outros aspetos que contribuem para melhores condições de vida. Um exemplo é a área da Cultura. O BE esteve e estará sempre empenhado em promover a Cultura, à qual é neste momento dedicado menos de 0.2% do PIB. Os profissionais são maioritariamente precários. Nesse sentido, estabilidade contratual e aumento da percentagem do PIB para pelo menos 1% são prioridades para o BE. Sabemos por experiência própria que muitos dos países para onde emigramos são muitas vezes mais apelativos nesta área, com uma oferta muito diversificada e que melhora a qualidade de vida extra-trabalho.
Cap Magellan: De que maneiras pretende apoiar os jovens portugueses que se encontram no estrangeiro à procura de melhores oportunidades?
Rita Nóbrega, Bloco de Esquerda: Os jovens emigrantes, muitos deles com a família e com filhos pequenos, debatem-se com as mesmas dificuldades que são infelizmente conhecidas pela comunidade portuguesa na Europa. Para fazer face a esses problemas e tal como consta do nosso manifesto eleitoral algumas das nossas prioridades para estas eleições são: o reforço dos serviços consulares; a melhoria dos serviços sociais; a garantia de cursos e manuais de língua e cultura portuguesas gratuitos e de qualidade; a criação de programas e dispositivos de apoio a projetos culturais e sociais; a revogação das alterações ao RNU para garantir o acesso aos cuidados de saúde primários e, consequentemente, a médico e enfermeiro de família. Todas estas medidas terão também impacto nos emigrantes mais jovens.
Língua portuguesa
Cap Magellan: Que medidas propõe para promover a aprendizagem da língua portuguesa, com especial atenção ao panorama internacional?
Rita Nóbrega, Bloco de Esquerda: As medidas que consideramos essenciais no que toca ao Ensino de Português no Estrangeiro são, como já referido, a abolição da “propina” na vertente do ensino de português como língua materna (PLM), bem como a gratuidade dos materiais dos manuais escolares adotados nessa vertente. Não respeita a Constituição que os alunos portugueses e lusodescendentes vejam o seu acesso à aprendizagem da língua portuguesa limitado por questões financeiras. Mais ainda, é inaceitável que sejam discriminados e preteridos em relação aos alunos, na maioria estrangeiros, da vertente do ensino de português como língua estrangeira (PLE). O PS usa o crescimento do número de alunos no PLE como capa para tapar a drástica diminuição dos alunos no PLM. Entendemos que uma vertente não pode substituir a outra, que não pode haver discriminação dos alunos portugueses e lusodescendentes e que a aprendizagem da língua portuguesa é um direito destes e não uma marca para ser exportada estrategicamente – assim, defendemos igualmente a transferência da tutela do EPE, na vertente PLM, do Ministério dos Negócios Estrangeiros para o Ministério da Educação, bem como a expansão da rede desta vertente do EPE, tanto na Europa como fora dela.
Indo para além do EPE, acreditamos que igualmente fundamental para fomentar a aprendizagem de qualquer língua é a cultura e a proximidade das comunidades. Assim, defendemos a criação de programas e dispositivos de apoio a projetos culturais e sociais para as portuguesas e portugueses residentes no estrangeiro.
No contexto nacional temos várias propostas que promovem, de várias formas, a aprendizagem da língua portuguesa. Pelo interesse da brevidade, destacamos algumas, como o reforço das bibliotecas escolares e da Rede Nacional de Bibliotecas Públicas, a exigência de 1% do PIB para a Cultura e a disponibilização gratuita de todas as obras nacionais em domínio público.
Cap Magellan: Tendo em conta que o português trata-se da terceira língua oficial da União Europeia mais falada no mundo, de que maneira pretende promover a conexão entre o português e o resto da Europa?
Rita Nóbrega, Bloco de Esquerda: Da mesma forma que o acesso ao ensino formal da língua portuguesa e às produções e iniciativas culturais na nossa língua são essenciais para promover o domínio do português entre portugueses emigrantes e lusodescendentes, uma estratégia semelhante deve ser adotada perante os cidadãos do resto da Europa (e do mundo). Assim, defendemos que o investimento na vertente do ensino de português como língua estrangeira (PLE) deve manter-se, bem como a cooperação com outros estados, de forma a reforçar a oferta do PLE nos diversos sistemas educativos e a aumentar o número de cidadãos europeus falantes de português.
Da mesma forma, a criação de programas e dispositivos de apoio a projetos culturais e sociais junto das comunidades portuguesas no estrangeiro contribui para difundir a língua portuguesa como língua de produção de cultura junto dos países de acolhimento.
Por fim, apesar da falta de investimento crónica dos variados governos do PSD e do PS na Cultura, sabemos que quando a produção cultural portuguesa consegue atravessar fronteiras alcança grande sucesso junto do público e da crítica, levando mais longe a língua portuguesa. Assim, os diversos apoios previstos pelo Bloco de Esquerda no âmbito da produção cultural em todas as suas formas – literatura, teatro, cinema, música, artes plásticas… – também têm um papel na difusão do português, na medida em que facilitam o alcance internacional de projetos artísticos em português, bem como o estabelecimento de parcerias com agentes culturais europeus.
Rita Nóbrega
Bloco de Esquerda