Le « sens du labyrinthe et la magie des arêtes » de Maria Helena Vieira da Silva
23 septembre 2019Mais uma Noite de Gala !
24 septembre 2019Na História de Portugal, o período da Expansão é, sem dúvida, aquele a que os historiadores deram maior atenção e relevo. O tempo das viagens marítimas, da constituição do Império, das terras d’Aquém e d’Além-mar, da colonização, da escravatura tem um lugar central na historiografia nacional. A ele todos se referem… Desses tempos emergem ilustres homens, nem sempre imaculados, figuras proeminentes duma epopeia que, segundo retórica antiga, terá dado «novos mundos ao mundo». Vasco da Gama, Pedro Álvares Cabral, Bartolomeu Dias, Infante D. Henrique…
Na vila de Mira, distrito de Coimbra, ergue-se uma imponente estátua em memória do Infante D. Pedro, duque de Coimbra, senhor de Montemor, Buarcos e Mira, filho de el-rei D. João I e de D. Filipa de Lencastre. Nascido no ano de 1392, fora o segundo de uma fratria de seis irmãos a que Camões apelidou de «ínclita geração». Por ter participado brilhantemente na tomada de Ceuta, em 1415, recebe o ducado de Coimbra. Versado em letras e ciências desde a sua mais tenra infância, viaja pelos principais centros políticos, económicos e culturais da Europa (1425-1428) onde cimenta uma sólida formação. Esse périplo vale-lhe o epíteto de “Príncipe das Sete Partidas”. Na sequência da morte prematura do seu irmão, el-rei D. Duarte, D. Pedro assume a regência do reino (1439-1448) até à maioridade de D. Afonso V. Cedo depara-se com a oposição das grandes famílias nobres do país, já que D. Pedro, em estadista visionário, tende para a centralização do poder real e para a dinamização do comércio encabeçada pela burguesia urbana. Entretanto, D. Pedro dá um rumo decisivo à exploração da costa africana, em detrimento das conquistas no norte de África. Mas a luta de poderes entre as casas nobiliárquicas (em particular as de Bragança, Viseu e Coimbra), já com D. Afonso V a reinar com plenos poderes, leva ao desfecho trágico da batalha de Alfarrobeira e à morte do Infante D. Pedro.
Chegaram até nós vários escritos da autoria do Infante, revelando uma consciência política ciente dos problemas do país e das medidas necessárias a tomar. De Flandres, endereça, em 1426, a Carta de Bruges a D. Duarte na qual aconselha o futuro rei a rodear-se de conselheiros e homens de leis oriundos dos três estados sociais. Representatividade social nos poderes políticos? No mesmo documento, apresenta uma reforma da Universidade que permitisse, a custo do erário da instituição, a inclusão de alunos mais pobres. Bolsas de estudo? Mas é no Tratado da Virtuosa Benfeitoria, por volta de 1431, que D. Pedro revela alguns dos seus mais notáveis traços de governante. A obra constitui o primeiro tratado de filosofia e política em língua portuguesa. Quantos às nomeações para os cargos administrativos, o Infante aconselha «que fossem os melhores, e não os amigos» e que os governantes tenham em consideração «o proveito dos súbditos e esquecer os próprios desejos». Quanto à distribuição das riquezas, «se os bens temporais fossem razoavelmente repartidos, e disso tivessem cargo os que o bem poderiam fazer, não haveria na cristandade mendigaria vergonhosa […] fazendo celeiros em certas comarcas, com que a caridade ocorresse àquele que a ventura foi falecer». A ostentação de riquezas pela nobreza, muitas vezes maus pagadores, é também alvo de críticas: «Não damos moradias aos de nossas casas, nem lhe ocorremos em o necessário, e jazemos em dívidas aos mercadores, não lhes pagando as coisas de que nos usamos».
Após a subida ao trono de D. Duarte, D. Pedro aconselha frequentemente o irmão na prudente concessão de benesses e outros privilégios, assim como na melhor forma de governar. Em 1437, a nobreza portuguesa impele o rei para as conquistas em Marrocos ambicionando terras e cargos para seu proveito. Prepara-se a expedição de Tânger. É um terrível fracasso, a que se junta a captura do Infante D. Fernando, refém dos Mouros até à sua morte. Um ano antes D. Pedro recomendara abandonar o projeto de conquista de praças norte-africanas e investir no desenvolvimento do território nacional. Os parcos meios financeiros e a pouca gente presente no país não permitiam ambições de conquista contra tão poderoso inimigo. Antes prosseguir para sul, junto à costa africana, e garantir o comércio da Guiné. Assim escrevia D. Pedro ao seu irmão: «Mas posto que passásseis e tomásseis Tânger e Alcácer e Arzila, queria Senhor que lhe fareis, porque povoá-las com reino tão despovoado e tão minguado de gente como este nosso, é impossível. E se o quisésseis fazer seria torpe comparação, como quem perdesse boa capa por mau capelo, pois era certo perder-se Portugal e não se ganhar África».
Seiscentos anos depois. Reforma do sistema de saúde, aumento do poder de compra, greve dos camionistas, avanço da extrema direita, racismo… Inúmeros problemas a enfrentar e a resolver para atingir níveis de desenvolvimento que possam garantir a todos os Portugueses melhorias significativas nas suas condições de vida. Exigem-se para isso governantes competentes e insuspeitos à imagem do Infante D. Pedro. Uma boa governança com uma nova geringonça?
Miguel Guerra, Professor de História
SIP – Liceu Internacional de Saint-Germain-en-Laye
SIP – Liceu Alexandre Dumas de Saint-Cloud
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