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30 novembre 2020O Pantanal, uma terra espetacular, devastada
3 décembre 2020Com o lançamento do seu livro “Imortal”, em França, publicado pela Editora Hervé Chopin, a Cap Magellan teve a oportunidade de entrevistar, por videoconferência, o escritor, jornalista e professor José Rodrigues dos Santos. No seu novo romance, onde traz de volta à ação a personagem Tomás Noronha!
CM: Como é que definiria o seu caminho de vida ?
JRS: O caminho de vida faz-se caminhando, formando-se e procurando a inovação. É essencialmente o que procurei fazer nas minhas várias profissões.
CM: Jornalista, professor, escritor, apresentador de televisão, há alguma que o faz sentir mais realizado a nível profissional ou estas complementam-se mutuamente ?
JRS: Sim, complementam-se umas às outras e isso traz-me uma variedade que eu gosto.
CM: Como é que descobriu o gosto pela escrita?
JRS: Foi por acidente, houve o presidente da associação portuguesa de escritores que achou que eu era romancista e pediu-me um conto para uma revista literária. Eu fiz-lhe este favor, porque não podia recusar, e descobri que gostava de escrever ficção. Foi mesmo por acaso, não foi uma coisa que eu tivesse, alguma vez, planeado na minha vida, e é por isso que estava a dizer que o caminho se faz caminhando.
CM: É comum da sua parte, abordar temas que à partida nos parecem delicados ou até, se me permitir, temas intrigantes, no fundo talvez podemos afirmar que a sua literatura reflete um bocadinho a busca pela verdade. Isso será a sua veia jornalística a falar mais alto ?
JRS: A grande literatura é a busca pela verdade, ainda que usem a ficção, que é uma mentira. Usando a ficção, que não é verdadeira, contam-se coisas que são verdadeiras. E as obras literárias tornam-se grandes pela sua capacidades de exprimir verdades através da ficção e isso encontramos nas grandes obras da literatura portuguesa, como Eça de Queirós, que no século XIX falou de um tema proibido em Portugal. Também em França, com o livro “A la recherche du temps perdu” de Proust, que é um livro que nos fala da nostalgia de infância, é mais um tema verdadeiro contado através da ficção, só que ele explica de uma forma mais clara. Portanto, a literatura não é sobre o estilo, embora ele seja importante, mas é sobre a verdade e, por isso, enquanto romancista, naturalmente, que a verdade é uma questão central, e isso também resulta da minha atividade enquanto jornalista.
CM: E podemos dizer que as personagens envolvidas de história nos seus livros, dão a mão à sua veia de professor?
JRS: Claro que há uma dimensão pedagógica nos livros. Aprendemos coisas diferentes em cada um dos livros porque cada um deles são reflexões sobre temas diferentes, da ciência, da história ou até de economia e, portanto, naturalmente, que quando abordo esses temas através da ficção transmito informações e faço uma reflexão sobre eles mas pronto, não é uma aula, é um romance.
CM: Confesso que o livro que mais me apaixonou foi o “Chave de Salomão”. Todo o mistério, e o facto de usar evidências científicas e relacioná-las com a descoberta da mente e a questão existencial que nos afecta a todos, foi sem dúvida, “a cereja no topo do bolo”. Com um cenário destes, completo e longo, questiono, onde encontrará tal inspiração?
JRS: Tudo é pesquisa, o romance nasce de uma ideia, depois faço a pesquisa dessa ideia para ver se tem pernas para andar e quando tem pernas para andar, crio o romance. A parte que acaba por ser a mais simples é a ficcional. O que é importante para mim é dominar o tema de uma maneira que me torno especialista nele e de forma a ser capaz de o explicar para o público em geral. Normalmente, a grande dificuldade que têm os cientistas ou académicos, em geral, é a de usar uma linguagem mais simples para tornar claro, o que às vezes, nem é assim tão confuso. As coisas parecem difíceis porque são escritas por pessoas que não têm técnica de escrever para o grande público. Afinal, o que faço no romance é “traduzir”, digamos, conceitos mais difíceis numa linguagem mais simples e clara. É esse o meu exercício.
CM: Para além da inspiração, creio que é necessário uma longa investigação e pesquisa sobre o tema que vai abordar e relacionar com a história que vai escrever. Em média, esses períodos de “pré-escrita” são muito morosos? Como se desenvolvem?
JRS: Pode levar um mês, vários meses, dois, três anos. O tempo é difícil de medir porque eu posso estar a procurar umas semanas um tema; depois paro, vou tratar doutro tema, retomo o primeiro… No final, é o tempo que for preciso.
CM: Prepara o livro antes de o escrever ou costuma deixar fluir?
JRS: Eu faço a pesquisa, depois concebo a história, de seguida escrevo, portanto, quando estou a escrever, já sei qual é a história toda.
CM: Que tipo de feedbacks costuma receber? Há algum que mais lhe tenha marcado?
JRS: Recebo e-mails de todos tipos de leitores, de todos os países. Cada leitor lê um livro à sua maneira, segunda a sua própria cultura, segundo as suas ideias e interpretam os livros de forma diferenciada. Umas coisas que uns gostam, outros não gostam. Cada pessoa é diferente e tem um universo próprio. Tenho leitores de 12 anos e depois leitores muitos idosos, de todos os países. É um público muito abrangente, não é segmentado.
CM: Qual é a relação com o público francês, visto que, por vezes, as vendas em França ultrapassam as vendas em Portugal? Como é o exemplo da “Fórmula de Deus”.
JRS: Houve um trabalho bem feito por parte da editora francesa, porque o sucesso que eu tenho na língua francesa não é só em França, e sim nos países de língua francesa, porque o país onde eu tenho mais leitores é o Canadá, depois de Portugal. De facto, a percentagem de pessoas que lê no Quebec é superior à de França. Também tenho leitores na Suíça, na Bélgica. O facto de eu também falar francês, penso que ajuda bastante na promoção dos livros. Por exemplo, estive à um mês e meio em França para ser entrevistado na televisão, nas rádios, portanto, tudo isso é algo de bastante positivo. Sou muito convidado para a Feira do Livro em Paris, para eventos literários, conferências e tudo isso é importante, a presença do autor.
CM: Mesmo assim, o que pensa sobre o impacto que os seus livros causam em Portugal e no mundo?
JRS: É difícil avaliar esse impacto porque, como eu disse, cada pessoa lê à sua maneira, e é óbvio que eu fico, muitas vezes, surpreendido pela reação que as pessoas têm. A influência que os livros têm na vida das pessoas, em muitos casos, tenho noção que os meus livros mudaram a vida dessas pessoas, e isso está um pouco fora do nosso controlo. Somos apanhados de surpresa. Uma vez fui à Hungria e a primeira pessoa que estava numa fila enorme disse-me que nunca leu nada na vida e começou a ler os meus romances, e agora é um leitor adepto de romances, portanto, mudei a vida dele. E esse tipo de reação tenho de pessoas muito diferentes, uma vez tive um leitor francês que me disse que estivera com uma depressão. Leu a “Fórmula de Deus” enquanto fez uma viagem de barco, em solitária, de Brest até aos Açores e disse-me que só levou o meu livro para ler, e quando chegou ao final da viagem, disse-me que já não se sentia depressivo, porque o livro tinha respondido a todos as perguntas que estavam na origem da sua depressão, portanto, existem muitas reações inesperadas. Ainda hoje, tive uma pessoa que me escreveu, que esteve infetado pelo Covid-19, esteve três semanas fechada em casa com febre, e durante este tempo só leu livros meus, portanto ficou a conhecer todas as minhas obras, à custa do Covid-19.
CM: A história é mais importante do que a forma como ela é exposta ?
JRS: As duas coisas são importantes, mas o mais importante é a verdade que o romance revela. Imagine-se, por exemplo, uns portugueses que emigraram para França. Se lerem um romance sobre a emigração para França, e ao lerem a história, reconhecem a sua história, na do livro vão perceber que o livro transporta uma profunda verdade sobre a sua própria experiência e isso é mais importante que o estilo. Na história o que mais importa é a verdade, a que está inserida no romance. É essa verdade que nos toca, pronto, é isso que do meu ponto de vista, faz a grande literatura.
CM: Que conselhos daria a um jovem jornalista ou escritor , em início de carreira ou até mesmo um jovem que tem vontade de se tornar jornalista ou escritor?
JRS: São conselhos que eu daria a qualquer pessoa que é em primeiro investir na sua formação, aprender a escrever no caso de jornalista, no caso de escritor fazer cursos, conhecer coisas novas, procurar caminhos diferentes. Nós próprios temos que nos educar, ir à procura do conhecimento.
CM: Se não fosse, a nível profissional, aquilo que é hoje, em que outra área pensa que se conseguia projetar?
JRS: É difícil dizer. Talvez a arquitetura.
CM: E para terminar, visto que o seu livro Immortel foi lançado em Setembro em França, consegue defini-lo em 3 palavras ?
JRS: Em três palavras não consigo, mas o que posso dizer é que é um romance sobre a inteligência artificial e o fim da humanidade como a conhecemos. E sobre o papel que a inteligência artificial vai desempenhar no fim da humanidade e na criação de uma nova. De um lado, o papel positivo por exemplo, através do desenvolvimento científico e, por outro lado, a ameaça que ela representa para a humanidade. Mas é sobretudo uma história sobre a via que vai permitir à humanidade atingir a imortalidade.
Artigo publicado no CAPMag de dezembro de 2020
Joana Carneiro e Pimenta Claire