
Entrevista com a grande fadista Ana Moura
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17 mars 2025A grande fadista Cristina Branco está no meio de uma turnê europeia. Passou na região parisiense em Poissy (78) no dia 8 de Março de 2025. A Cap Magellan estava presente e ela ofereceu-nos uma entrevista exclusiva.
Cap Magellan: Boa tarde, Cristina. Espero que esteja tudo bem contigo. Estamos hoje em Poissy onde vais cantar logo à noite no Théâtre de la ville. Estás ansiosa?
Cristina Branco: Claro que sim. Estou sempre ansiosa, mas voltar ao francês é sempre um momento muito especial, sobretudo num dia como o de hoje, Dia Internacional da Mulher.
Cap Magellan: Vais apresentar as músicas do teu último álbum, Mãe. O que é tão especial neste disco?
Cristina Branco: Mãe, na verdade, é uma espécie de volta a casa. Depois de fazer múltiplas outras coisas, achei importante gravar um disco que remetesse para o fado tradicional. Uma boa parte desse trabalho são fados tradicionais, arranjados pelos três músicos que vão estar aqui comigo esta noite: o Bernardo Couto, o Bernardo Moreira e o Luís Figueiredo. No fundo, ele é especial porque, para mim, ser mãe é quase como começar uma civilização, é uma coisa grandiosa. No fundo, Mãe é voltar a casa, ao ninho, àquilo que nos conforta.
Cap Magellan: Escreveste uma música deste álbum. Compor um fado é sempre um desafio importante, não é?
Cristina Branco: Sim, é sempre um desafio. Neste momento, há pouco menos de 100 fados tradicionais. Vão ser uma boa parte do concerto. O que acontece é que, como eu disse, eles estão arranjados: tens a base do fado tradicional e os três músicos fazem arranjos para eles. Neste álbum, foi a primeira e provavelmente a última vez que faço uma música.
Acontece que eu ia no carro, nessa altura, e estava a assobiar algo. De repente, pensei que era muito bonito. Pedi ao meu filho que estava ao meu lado para gravar. Quando estávamos a preparar o disco, mostrei aos rapazes. Mas é uma coisa muito singela. Não imagino fazer outras músicas. Pode acontecer, mas essa não é a minha característica. Eu sou uma intérprete de letras. Não me sinto à vontade para isso.
Cap Magellan: Quando nos vimos em Outubro de 2023, em Saint-Quentin-en-Yvelines, com o Ensemble de Des Équilibres, houve um momento do concerto só de fado com guitarra portuguesa. Vai acontecer hoje também?
Cristina Branco: Só com guitarra portuguesa não. Vão acontecer momentos diferentes. Há momentos em que a guitarra está sozinha comigo. Por exemplo, um dos fados começa só com voz e guitarra. Mas um fado inteiro só voz e guitarra, não. Até porque isso não é muito comum. O que fizemos com o Des Équilibres é diferente. Aliás, o disco já saiu! É muito bonito, estamos muito orgulhosos. Mas, de facto, eles não são acompanhadores de fado, nem querem ser. Fazemos isso para que as pessoas percebam um bocadinho do que é que é o fado tradicional, mas não é a maneira correta de ilustrar o fado.
Cap Magellan: Como disseste, o álbum com o Ensemble Des Équilibres saiu. Está previsto uma turnê?
Cristina Branco: Está, está a ganhar forma. O concerto de apresentação ainda vai ser este ano e já estão várias datas marcadas para o ano que vem. Vai ser um projeto vivo. Vai ter a sua durabilidade e não só. Está a ganhar estrutura.
Cap Magellan: Aliás, a falar de França, voltas em França em Pamiers, dia 9 de maio, no âmbito da tua turnê pessoal. Disseste que gostavas muito de cantar em França. Porquê?
Cristina Branco: Gosto. Já trabalhei muito em França. Na verdade, gravei durante seis ou sete anos para a Universal Francesa. Apesar de ser uma artista portuguesa, gravava para uma companhia francesa. Podes imaginar que, estando numa companhia francesa, trabalhava mesmo muito em França.
Cap Magellan: O que achas do público francês? O que é que ele tem a mais?
Cristina Branco: Não tem nada a mais. Todos os públicos são diferentes. É um público que entende a música portuguesa com a mesma profundidade do que os portugueses. Depois tens muitos portugueses sempre misturados no público, mas não são a maioria. Também há uma longa tradição da música portuguesa e da cultura portuguesa em França. Teve sempre muito peso. É uma valorização do nosso trabalho e o reconhecimento. Sou muitíssimo grata por isso.
Cap Magellan: O teu álbum Mãe foi publicado em Setembro de 2023, se não me engano. Estás a preparar outro?
Cristina Branco: Sim, este ano já saiu o álbum com o Ensemble Des Equilibres. Também gravei agora em Janeiro um disco… Tenho um disco que se chama Abril, que são só músicas de Zeca Afonso. Fizemos um segundo volume de Zeca Afonso, que se vai chamar Mulheres de Abril. São só as mulheres que o Zeca cantou, interpretou. Já está gravado mas vai sair aos pouquinhos. Vai sair uma música em breve, ainda em março penso. Depois, mais para o final do ano, vai sair o álbum. Portanto, temos dois álbuns a sair e, ainda no final deste ano, provavelmente gravaremos o próximo desta banda.
Cap Magellan: Em 2018 publicaste um livro, um road cook. Porque decidiste lançar-te neste universo e o que achaste da experiência?
Cristina Branco: Gostei muito. No fundo, este livro foi uma necessidade, porque nós temos vidas muito aceleradas e passamos muito tempo na estrada. Por exemplo, eu não gosto de jantar antes do concerto, portanto tenho os meus pozinhos de perlim-pim-pim para jantar depois. Normalmente viajamos muito cedo. Há aqui pessoas que vão sair às quatro da manhã, outros que saem às oito. Ou seja, nós nunca temos muitos horários. Há uma necessidade de comer bem, porque trabalhamos muito, porque não temos horários para nada: não temos horários para levantar, não temos horários para deitar, etc. É uma vida difícil, ao contrário do que as pessoas pensam. Não tem nada de glamour, tem de muito trabalho, muito sacrifício, um sacrifício pela arte e pela música, obviamente. Por amor também, porque nada disto se faz sem um profundo amor àquilo que nós temos aqui, que é a música. Esses sacrifícios depois revertem no nosso organismo.
Resolvi fazer uma espécie de menu que tem a ver com uma limitação. Para já, alcalina porque a comida ácida prejudica as cordas vocais.
Portanto, comecei a perceber que beber água mais alcalina e também juntar vários alimentos que fossem menos ácidos beneficiaria a minha voz. Como nós não temos horários para comer, pensei em juntar coisas que sejam saudáveis e que sejam mais alcalinas, para me beneficiarem a mim, mas que toda a gente gosta. Foi assim que nasceu. Não tem nada de complicado.
Cap Magellan: É um projeto muito bonito.
Cristina Branco: É bonito, ou seja, ele está registrado e tem, são várias receitas alcalinas, tem fundamento científico. Pelo meio vou contando umas histórias do que é que aconteceu na estrada também, episódios engraçados da vida de estrada. Sim, é muito giro. Não imaginei que tivesse tantas histórias para contar naquela altura e deu-me um gozo incrível poder fazer aquilo.
Cap Magellan: Tens muitos projetos, do que vejo, ainda há outros que não citei?
Cristina Branco: Tenho sempre muitos! Participo de um projeto que se chama Amália na América com a Raquel Tavares e o Ricardo Ribeiro. Vem de um disco que ela gravou com fados e blues americanos. A Raquel e o Ricardo cantam fados e eu canto os temas da Broadway. Também trabalhamos com sinfônica ou com uma orquestra de jazz.
Cap Magellan: A minha última pergunta: tens uma mensagem para os jovens lusodescendentes?
Cristina Branco: Hoje à noite vou ler um texto que escrevi à tarde sobre o dia de hoje, o Dia Internacional da Mulher. Acho que estamos a viver um momento terrível. Tenho uma filha de 16 anos e um filho com 21 anos, vejo e olho para os meus filhos, percebo a falta de perspectiva que eles têm para este mundo e isso assusta-me imenso, o futuro deles, o vosso futuro. Temos de ser fortes, temos de ter força.
Cap Magellan: Obrigada Cristina! Uma mensagem muito importante.
Compre já os seus bilhetes para o concerto de Cristina Branco em Pamiers dia 9 de maio!
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Entrevista realizada pela Julie Carvalho,