Esta cidade é o objectivo do grupo de peregrinas que seguimos no filme « 11 fois Fatima » (« Fátima » na versão original). João Canijo segue o caminho emocional e bastante físico que estas mulheres do Norte decidem fazer. Cada uma tem a sua motivação e a sua maneira de lidar com a dificuldade da peregrinação… Cada uma é uma mulher que escolheu caminhar dias e dias, deixando-se por vezes dominar pelas emoções.
Este filme, que se aparenta a um documentário, expõe a experiência da peregrinação, uma escolha pessoal que nem todos percebem, e que é apresentado aqui sem « disfarce », levando a refletir sobre os preconceitos que podem existir acerca do tema.
Com a saída do filme em França, no dia 12 de junho de 2019, e após o sucesso que conheceu em Portugal, a Cap Magellan teve a oportunidade de fazer algumas perguntas ao realizador João Canijo (« Sangue do Meu Sangue » em 2011) e à atriz Rita Blanco (« A Gaiola Dourada » em 2013).
Começámos por questionar a atriz que interpretou uma figura importante do grupo de peregrinas, para descobrir como é que tinha sido trabalhar neste novo projeto.
Rita Blanco: Trabalhar neste filme, e com o realizador João Canijo, faz parte de um projeto longo e contínuo, e por isso não foi uma surpresa e foi uma continuação de um processo de trabalho conjunto de muitos anos. Quero sempre trabalhar com o João porque é um realizador que me conhece bem, que sabe pedir o que precisa para servir o filme, e que me leva mais longe no meu trabalho.
Rita Blanco: A minha preparação para este filme teve mais a ver com o estudo do contexto e da personagem do que propriamente uma preparação atlética. E como eu sempre andei, não foi muito complicado…
Rita Blanco: Nunca tinha ido a Fátima enquanto peregrina. Mas fui com peregrinos verdadeiros, na minha preparação. E foi importante ir.
Rita Blanco: No fim do filme, eu estava cansada, e sendo um trabalho de grande tensão – como são sempre os filmes do João Canijo – estava esgotada e queria voltar para casa e dormir bem!
Rita Blanco: Trabalhar com tantas mulheres não tem que ser um problema, e não é essa a questão, parece-me… Mas são muitas atrizes, cada uma com o seu ego… E o João Canijo adora explorar esse ambiente ! Foi difícil algumas vezes, não digo que não…
Rita Blanco: Sabe, esse é o meu trabalho… Expor-me de alguma forma… Mas aquela, sou eu como personagem. Não sou a Rita, ali. Isso, é o que faço…
Rita Blanco: Todas as histórias, todas as personagens têm as suas especificidades. Esta está num contexto religioso que tem a ver com a vida e com as pessoas. Não há nada de muito espiritual no próprio filme… Esse é apenas o pretexto para mostrar aquelas pessoas.
Rita Blanco: Acho que as pessoas, numa situação limite, de cansaço, de sacrifício físico e emocional, exacerbam a sua maneira de reagir ao que se passa à volta. Mas não mudam, sobretudo nessa altura. O momento espiritual talvez seja depois, mas mudar, poucas pessoas o fazem, não acha?
João Canijo: Porque a peregrinação trata de um esforço levado cada dia ao limite do esgotamento, sabendo que no dia seguinte, o mesmo sacrifício se repete. Ao mesmo tempo, numa peregrinação, dá-se o paradoxo entre a busca da elevação espiritual e a natureza humana. O filme é sobre esse conflito, em que geralmente a natureza humana se sobrepõe à aproximação ao transcendente.
João Canijo: As atrizes fizeram todas peregrinações reais, longas e esgotantes. Antes de lhes pedir esse esforço, eu também o fiz. Até para tentar compreender as razões que levam a este sacrifício.
João Canijo: A ideia sempre foi fazer uma ficção disfarçada de documentário. O resultado foi conseguido pela pesquisa das actrizes, foram elas que trouxeram as situações e as circunstâncias reais ao filme. Praticamente nada do filme é inventado, é tudo roubado das experiências reais das actrizes.
João Canijo: Completamente diferente. Mas há uma clara maioria de mulheres nos caminhos de Fátima. E isso também se verificou nos vários grupos das peregrinações reais das actrizes.
João Canijo: Porque o filme foi uma tentativa de apresentação da realidade, e ela foi investigada exaustivamente. Ainda hoje, estou a tentar compreender porque é que as pessoas fazem aquele sacrifício daquela forma.
João Canijo: Para mim não existe verdade, só existem diferentes interpretações da realidade. Por isso, na minha opinião, não faz sentido a imposição de um ponto de vista, seja ele crítico ou faccioso. Ao espectador, cabe fazer a sua interpretação de uma realidade que lhe é apresentada.
João Canijo: Eu continuo tão estupefacto com a religião como antes. Mas consigo entender melhor as pessoas religiosas. Não sei se pode mudar alguma coisa, e a intenção nunca foi essa.
João Canijo: A chegada a Fátima é sempre um momento de catarse e de alívio.
Lurdes Abreu
capmag@capmagellan.org